A gente não é feliz o tempo todo

Ana Flávia
2 min readMay 21, 2023

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por que insistimos que nossa vida deveria ser somente flores?

Eu perseguia o ideal de que a vida devia ser uma sucessão de primaveras. Quando os outonos chegavam, eu resistia. Queria viver rodeada de flores. Tentava forçar brotos a florescerem fora de época. E lutava contra as folhas que insistiam em cair das árvores.

Estar alegre é muito bom. Gosto quando estou com a alma dançante. Leve. Com vontade de passar batom vermelho e ir pro mundo. Motivada. Produzindo frutos. No entanto, desejar viver numa eterna primavera seria como esperar o nascer do Sol para depois impedi-lo de se pôr.

Se a ideia de interditar os ciclos da natureza parece absurda, por que insistimos que nossa vida deveria ser somente flores? Os outonos e invernos também fazem parte. Somos convocados a lidar com períodos densos e frios, que às vezes perduram por horas, e noutras por meses.

Nas noites invernais, em contraste com a luz do dia, temos a chance de perceber o que realmente importa. Se estivermos atentos, contemplamos os galhos secos e lembramos da beleza das flores da primavera. O frio nos gela e desejamos sentir na pele o calor do verão. E, cheios de vontade de ter o que não temos, nos movimentamos para ver o Sol nascer novamente.

Quando a luz reaparece no horizonte, a alegria do rair é incomensurável. O céu deixa o escuro de lado e os raios do Sol anunciam seu retorno. As flores mortas que caíram no solo adubaram a árvore para que novos brotos surgissem. A metamorfose em adubo é o tesouro que sustenta seu crescimento.

Perceber o contraste entre verões e invernos desperta em mim uma vontade imensa de viver todos os ciclos com integridade. Curtir a nova primavera que chega desde o primeiro broto que nasce até a última flor que morrerá. Contemplar o pôr do sol que inevitavelmente acontecerá.

Altos e baixos. Alegrias e tristezas. Fluxos e refluxos. Acolher o ritmo da natureza é um desafio, mas resistir a ele é ainda mais doloroso. Sigo aprendendo a compreender o ritmo da vida. E admito que continuo gostando mais dos verões. Mas dou um imenso valor e respeito à sabedoria dos invernos.

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Ana Flávia

Escrevo pra mim desde criança, e agora também publicamente. Compartilho porque acredito que é na troca que crescemos e ampliamos a consciência. @anaflavia.vf